quinta-feira, 14 de junho de 2007

Poemas de José Tolentino Mendonça

Dias atrás rolou aqui no Música&Poesia o curta português Morreste-me, produção que tem texto baseado em poesias de José Tolentino Mendonça. Pra quem não conhece o poeta, abaixo um pouco sobre ele e três dos poemas que embasaram o roteiro do filme.

José Tolentino Calaça Mendonça - Teólogo e poeta português.

Nascido em Machico, ilha da Madeira em 15-12-1965, poeta e ensaísta, deu início ao estudo de Teologia em 1982. Uma vez ordenado Padre, em 28-07-1990, deslocou-se para Roma, onde terminou o seu mestrado em Ciências Bíblicas. Certa vez confessou sobre a sua vocação religiosa afirmando que "foi uma coisa de juventude, inconseqüente, imprudente, inesperada, que eu procuro manter". Regressado a Portugal lecionou "Cristianismo e Cultura" e "Hebraico" na Universidade Católica Portuguesa de Lisboa, desempenhando igualmente as funções de Capelão na mesma universidade. Doutorado em Teologia Bíblica e escritor de peças de teatro, é igualmente diretor da revista de teologia Didaskalia editada pela Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa de Lisboa. Atualmente é professor auxiliar na mesma Universidade.

Publicou vários títulos a partir de 1990 - Os dias contados, 1990, As estratégias do desejo, Ed. Cotovia, 1995, Longe não sabia, Ed. Presença, 1997. A que distância deixaste o coração (com fotografias de Vicente Moreira Rato), Ed. Assírio e Alvim, 1998. Baldios, Ed. Assírio e Alvim, 1999. De igual para igual, Ed. Assírio e Alvim, 2001. Traduziu também O cântico dos cânticos e a poeta italiana Cristina Campo. Perdoar Helena é a sua primeira incursão no teatro.


A presença mais pura

Nada do mundo mais próximo
mas aqueles a quem negamos a palavra
o amor, certas enfermidades, a presença mais pura
ouve o que diz a mulher vestida de sol
quando caminha no cimo das árvores
«a que distância da língua comum deixaste
o teu coração?»

A altura desesperada do azul
no teu retrato de adolescente há centenas de anos
a extinção dos lírios no jardim municipal
o mar desta baía em ruínas ou se quiseres
os sacos do supermercado que se expandem nas gavetas
as conversas ainda surpreendentemente escolares
soletradas em família
a fadiga da corrida domingueira pela mata
as senhas da lavandaria com um "não esquecer" fixado
o terror que temos
de certos encontros de acaso
porque deixamos de saber dos outros
coisas tão elementares
o próprio nome
Ouve o que diz a mulher vestida de sol
quando caminha no cimo das árvores
«a que distância deixaste
o coração?»

José Tolentino Mendonça
de A Que Distância Deixaste o Coração
Anos 90 e agora
uma antologia da nova poesia portuguesa



Sobre um improviso de John Coltrane

Ainda espero o amor
como no ringue o lutador caído
espera a sala vazia

primeiro vive-se e não se pensa em nada
não me digam a mim
com o tempo apenas se consegue
chegar aos degraus da frente:
é didícil
é cada vez mais difícil entrar em casa

não discuto o que fizeram de nós estes anos
a verdade é de outra importância
mas hoje anuncio que me despeço
à procura de um país de árvores

e ainda se me deixo ficar
um pouco além do razoável
não ouvem? O amor é um cordeiro
que grita abraçado à minha canção


Se me puderes ouvir

O poder ainda puro das tuas mãos
é mesmo agora o que mais me comove
descobrem devagar um destino que passa
e não passa por aqui

à mesa do café trocamos palavras
que trazem harmonias
tantas vezes negadas:
aquilo que nem ao vento sequer
segredamos

mas se hoje me puderes ouvir
recomeça, medita numa viagem longa
ou num amor
talvez o mais belo


Fontes:
nEscritas
ArtistasUnidos
Wikipédia, a enciclopédia livre

Um comentário:

Anônimo disse...

Adorei as poesias de José Mendonça. Realmente não tinha muito conhecimento dele, e adorei o trabalho dele. Continue assim, divulgando mais e mais artistas desconhecidos no seu blog!
Um beijão!