sábado, 12 de maio de 2007

Conheça a sonoridade de Babilak Bah

O som da enxada, da bacia, da alma
por Marina Maria


Ele acha o ritmo em qualquer pedaço, tambor ou sucata. Ele escreve música e canta poesia. Sem deixar nada disso de lado, investiga temáticas sociais e políticas em seu trabalho. Babilak Bah, artista paraibano que vive em Belo Horizonte, fala do ritmo como entidade sagrada e do tambor como um grande mestre. Sentada num café, escuto-o narrar suas histórias com a destreza de quem é íntimo da palavra.

Gilson César da Silva, que mais tarde ganharia o apelido de Babilak, ainda criança já cantava e batucava pelos cantos de seu bairro. No bar da esquina ele tirava sons dos copos cheirando a cerveja e pinga e voltava para casa com os bolsos cheios de moedas. O músico viveu sua infância e adolescência em João Pessoa, criado pela mãe, Iracema Gomes da Silva. Mesmo sendo analfabeta, foi dela que Babilak herdou o interesse pela palavra. “Cresci ouvindo seus cânticos e rimas”, conta.

Dona Iracema, empregada doméstica, levava o menino todos dias para o trabalho na casa de uma família da classe alta. Na biblioteca dessa casa ele olhava os livros admirando a quantidade de letras e cores. Um dia, conta, num acesso literário, roubou da estante o livro “Eu”, de Augusto dos Anjos. “Esse livro marcou muito a minha vida. Foi ali que descobri a literatura. Além do que, foi meu primeiro delito”. Naquela casa, Babilak teve contato com outros livros, revistas e jornais e conviveu com políticos da sociedade paraibana que sempre passavam por ali. “Ir da minha casa para a casa deles era um transitar entre dois mundos”, explica.
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Talvez tenha sido essa convivência com políticos na adolescência, ou fato de ter nascido na véspera da data de início da ditadura, 1º de Janeiro de 1964, ou apenas a vontade de se envolver com as questões políticas no país. O fato é que a política foi uma parte importante da vida de Babilak. Ele conta que tudo começou com um grupo da igreja local, do qual ele fez parte no início dos anos 80. O grupo discutia a situação atual do país e lá Babilak se envolveu com teatro, música e poesia. Foi também nessa época que o adolescente encontrou pessoas que o despertaram para o valor da cultura popular e da negritude. Ele passou a conhecer Nietzsche, Gramsci, Naná Vasconcelos, Paulinho da Viola, e Pierre Verger, além dos emboladores de coco e todo o cenário musical Nordestino, especialmente o Movimento Jaguaribe Carne.

Depois vieram os movimentos negros, e mais tarde a militância do PT. Como poeta do partido, viajou o Brasil inteiro, recitou versos em um comício do Lula e até vira garoto-propaganda do PT. “Eu não sei muito bem como isso aconteceu, um dia tiraram minha foto e no outro eu estava estampado em camisetas e bótons do partido”, conta com um sorriso discreto e uma pontinha de orgulho. “Ver minha imagem projetada foi importante para me ajudar a me assumir como artista”, acrescenta.

“Eu era músico e não sabia”
Mesmo durante suas atividades ligadas à performance no grupo da igreja e mais tarde suas viagens pelo país como o poeta do PT, Babilak explica que não se imaginava como artista. “Eu era desencontrado com minhas vontades”. O encontro aconteceu em 1988, quando ele estava em Brasília se preparando para mais um comício do PT. Na sala onde aguardava havia um atabaque, e o artista começou a tocar o instrumento, até que um homem que passava na porta entrou atraído pelo som. “Ele disse que eu tocava bem e perguntou se eu não queria substituir um percussionista num barzinho naquela noite. Eu não ia fazer nada mesmo, então aceitei”. E assim, meio que por acaso, Babilak subiu no palco e algo mudou. “Eu me achei”, conta.

No mesmo ano Babilak fez sua primeira visita à Belo Horizonte, atraído pelo movimento musical do Clube da Esquina e pela produção literária da cidade. Dois anos depois voltou para a Paraíba, e em 1990 conheceu uma belo-horizontina com quem se casou. “Não tinha jeito, BH tava no meu destino”, ele fala sorrindo. Depois de voltar para a cidade mineira, começou a desenvolver seu trabalho como percussionista partindo de um instrumento inusitado: a enxada. O músico conta que a idéia também surgiu de repente, enquanto assistia a um show. Durante uma das músicas, um dos percussionistas pegou uma enxada e tirou um som fino dela, tocando sua parte metálica. “Aquele som ficou guardado comigo”.

A terra e a loucura
Em 1998, Babilak criou o projeto “Enxadário”, a partir de uma oficina chamada “Saque Sonoro”, em que o artista experimenta com o som de enxadas e outros instrumentos inusitados. Em 2003 ele teve o projeto de um cd aprovado na Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte. Três anos depois, ele lançou o álbum “Enxadário - Orquestra de Enxadas”, com a presença de outros quatro músicos. Nas músicas, a temática da reforma agrária é forte, coisa que carrega consigo nas lembranças de infância. “A questão da terra no nordeste é muito forte. Lembro dos grandes acampamentos do Movimento Sem-Terra que ocupavam a Praça dos Três Poderes de João Pessoa. Outra coisa que me marcou demais foi o massacre de Eldorado de Carajás ( no episódio, ocorrido no sul do Pará, 19 sem-terra foram mortos pela Polícia Militar durante um protesto do MST em 17 de abril de 1996)”.

Babilak realiza também um trabalho com portadores de sofrimento mental do Centro de Convivência de Venda Nova, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. O artista desenvolve uma oficina de ritmo, musicalidade, expressão e criatividade. Em 2002, a experiência rendeu um cd, com participação de 37 dos 70 pacientes. O álbum “Trem Tan-Tan” registra as experiências musicais do grupo e conta com direção musical de Babilak Bah e participação de vários outros músicos mineiros. Em parceira com a prefeitura de BH, o cd foi lançado no mesmo ano e atualmente está esgotado.

O futuro e o nome
Além de realizar shows do Enxadário e do Trem Tan-Tan, de ter lançado três livros de poesia e composto trilhas para espetáculos da dança (a música Haga-Mangue foi feita para a Companhia de Dança Cisne Negro de São Paulo no espetáculo “C/Cordas”) e para o cinema (ano passado uma de suas músicas fez parte da trilha sonora do filme brasileiro “Mão Armada”), Babilak Bah ainda quer muito mais. Ele conta que seu maior sonho é compor mais para o cinema, mas enquanto isso não acontece, ele planeja para novembro desse ano um espetáculo que envolve poesia, performance, instalação e filme. E para o ano que vem já está compondo um disco que, segundo Babilak, vai ser seu “reencontro com a Paraíba”, com uma releitura contemporânea da tradição cancioneira do estado.

E se até agora a origem do nome “Babilak Bah” não foi explicada, é porque ele guardou a revelação para o final, e aqui resolvi fazer o mesmo. O nome, o artista explica, surgiu durante um acampamento com amigos, enquanto Babilak “batia” num atabaque. Um de seus amigos disse “quando você toca esse atabaque sai um tanto de babilak”. O nome pegou, e mais tarde, sua primeira esposa (que era numeróloga) adicionou o “Bah”, para uma harmonização do nome. Mas para cada pessoa que pergunta o porquê do nome ele inventa uma resposta. “É um personagem que foge da ignorância”, ele também me disse...

Para conhecer: www.babilakbah.mus.br
Para ouvir: www.myspace.com/babilakbah
Para ver: www.youtube.com/babilakbah
Fonte: OverMundo

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